Romilda Teodora Ens, um olhar psicossocial nas pesquisas sobre formação de professores e políticas educacionais

O interesse de Romilda Teodora Ens pela docência começou cedo e levou ela a coordenar o processo de formação continuada de professores no Paraná e hoje ser pesquisadora sobre a área

Por Alexandra F. M. Ribeiro e Alboni. M. D. P. Vieira
Romilda Teodora Ens nasceu em Curitiba, no dia 3 de setembro de 1942. Seus pais, Zola Cunico e Judite de Sá Cunico, viviam em São José dos Pinhais, no casarão da família Sá, como era conhecido. As filhas do casal haviam nascido em casa, com o auxílio de uma parteira, prática comum à época. Romilda, no entanto, não nascera em casa, mas em uma maternidade. O nome que recebeu foi uma homenagem às avós paterna e materna.
Zola era filho de imigrantes italianos, mecânico, que havia começado a trabalhar após completar o segundo ano do ginásio. Não havia podido completar seus estudos, mas apreciava ler e realizar estudos por correspondência. Judite era de origem portuguesa e brasileira, nascida em São José dos Pinhais, e tinha sob sua responsabilidade gerir os assuntos da casa e atender aos sobrinhos e vizinhos. Estudou até o 4º ano primário e queria ter sido professora. Gostava de ler e de escrever, principalmente cartas. Na época do Natal, enviava cartões para toda a família. Da união de Zola e Judite nasceram cinco filhas: Romilda Teodora, Mercedes Teresa, Olga Leocádia, Anita Maria e Célia Elisa, que fizeram seus estudos, do primário à Escola Normal, em escolas públicas. Diziam seus pais que o que podiam deixar para as filhas era o estudo, para que se tornassem independentes.
Em depoimento, Romilda relembra sua infância, contando que sua distração era ler, conversar e brincar na rua, em frente à sua casa, com os primos e vizinhos. Nessas brincadeiras, o jogo de “bete ombro”1 era seu preferido. Contou também que a casa da família dispunha de um pomar e de uma horta, bem cuidados, que forneciam frutas da época e verduras. No quintal da casa havia um poço com água sem contaminação, que em épocas de seca, abastecia toda a vizinhança.
As festas da Páscoa e do Natal eram tradição na família Cunico. No Natal, estavam presentes a árvore de Natal e o presépio. Romilda explica que esses aspectos, segundo Bourdieu (2009, p. 87), estruturam o habitus, que funciona como “[…] princípios geradores de práticas e representações […] sem em nada ser o produto da obediência a algumas regras […mas] coletivamente orquestradas”, que passaram a subsidiar seu pensamento, suas percepções e ações e constituíram seu “[…] capital acumulado” (p. 93).
O interesse pela docência surgiu muito cedo, quando, na 3ª série do ginásio, começou a atuar como “professora” para os colegas que ficavam para exames de segunda época. Em 1957, ao ingressar no Instituto de Educação do Paraná2, com 15 anos de idade, recebeu o convite para ministrar aulas para 20 alunos que prestariam exame de admissão ao ginásio. Essa fase em que ministrou aulas particulares marcou o início de seu trabalho como professora, envolvendo também suas irmãs mais novas, que passaram a colaborar nessas aulas. Aos 18 anos, cursando o 3ª ano da Escola Normal, em setembro de 1960, com apoio de um deputado estadual e como parte de estratégia eleitoral da época, foi nomeada professora e iniciou seu trabalho, oficialmente, no Grupo Escolar Silveira da Motta. Com isso, alcançara a meta de ser independente financeiramente, corroborando o pensamento de seu pai – “a mulher precisa trabalhar fora” -, que não era a tônica da época. Mas, continuar os estudos em uma faculdade, então, não era possível…
Em 1964, Romilda se casou com o sr. Nilson Maciel dos Santos, aeroviário e do comércio, com quem teve uma filha, Simone Rachel, tendo ficado viúva em 1966. Na esteira desses acontecimentos, continuou como professora no Grupo Escolar e decidiu continuar seus estudos. Realizou um curso de Administração Escolar, pós-médio, e dois cursos superiores: Pedagogia e Direito, na UFPR. À época, recebeu um convite do prefeito da cidade e assumiu a direção da Escola de Aplicação, anexa à Escola Normal Henrique Pestalozzi, em São José dos Pinhais.
Em 1972, deixou a direção da Escola de Aplicação, para trabalhar junto ao grupo da Secretaria de Estado da Educação do Paraná, no setor de planejamento e formação de professores. Com a criação do Cetepar – Centro de Treinamento do Magistério do Estado do Paraná, foi designada para coordenar o processo de formação continuada de professores no Paraná, planejando e desenvolvendo cursos para professores. Nesse movimento, casou-se, em 1975, com o Prof. Waldemar Ens, biólogo e professor universitário, autor de livros didáticos de Ciências e Matemática, com o qual viveu por 29 anos. Sobre ele, Romilda menciona ter sido seu “parceiro e querido companheiro, amigo, irmão que em vida contribuiu para que eu alcançasse meu ideal e, com certeza, está ao meu lado nas conquistas que consegui”. Dessa união, nasceu Paulo Roberto, casado com Ana Paula. Atualmente, Romilda é avó de Taís e Matias, filhos de Paulo Roberto, e de Rafael e Renan, filhos de Simone Rachel. É ainda bisavó de Cecília e Isabella.
Prosseguindo seus estudos, Romilda concluiu o mestrado em Educação na UFPR e ingressou na educação superior em 1988, como professora do curso de Pedagogia. A partir de 2000, passou a trabalhar na Pontifícia Universidade Católica do Paraná, período em que realizou seu doutorado na PUC de São Paulo. Durante esses estudos, Romilda conta que o contato com a Teoria das Representações Sociais levou-a a tomar esse olhar psicossocial como elemento que fortaleceu suas pesquisas sobre formação do professor e políticas educacionais. Segundo ela, deparou-se com “[…] uma transfertilização de conjunturas, interesses e intenções” (MOSCOVICI, 2003, p. 314), as quais passaram a apontar novos desafios para a pesquisa em políticas e formação de professores. Ficava claro para ela, na esteira de Moscovici (2011, p. 180) que “Quando a ideia muda, a realidade em que vivemos juntos não é mais a mesma”.
Atualmente, Romilda é professora do Programa de Pós-Graduação em Educação da PUCPR e Coordenadora do Grupo de Pesquisa Políticas, Formação do Professor, Trabalho Docente e Representações Sociais – POFORS, no PPGE/PUCPR. Além disso, é pesquisadora associada da Fundação Carlos Chagas/SP, participa do Centro Internacional de Estudos em Representações Sociais, Subjetividade e Educação – CIERS-Ed/FCC, da Red Latinoamericana de Estudios Epistemológicos em Política Educativa – ReLePe, da rede de pesquisadores de grupo de pesquisa na PUCSP-NEARS (Núcleo de Pesquisa Internacional em Representações Sociais) e da Rede de Grupos de Pesquisas CIEEP/Direitos Humanos (Centro Internacional Interdisciplinar de Estudos e Pesquisas/UNESA). Realizou estágio pós-doutoral na Universidade do Porto, em Portugal. Registre-se que sua participação em eventos nacionais e internacionais, como também na organização e publicação de livros, capítulos de livros e artigos acadêmicos em periódicos qualificados da área educacional é intensa.
Por sua dedicação e força de trabalho, aliadas à sua competência na área educacional, a professora Romilda Ens é admirada e respeitada por aqueles que têm a satisfação de conhecê-la.

Para saber mais

Acesse o Currículo Lattes da professora Romilda Teodora Ens:
http://lattes.cnpq.br/9523516398079195

  • BOURDIEU, Pierre. Estruturas, habitus, práticas. In: BOURDIEU, Pierre. O senso prático. Tradução Maria Ferreira. Petrópolis, RJ: Vozes, 2009. p. 86-107.
  • MOSCOVICI, Serge. Representações sociais: investigações em psicologia social. Tradução do inglês por Pedrinho Guareschi. Petrópolis, RJ: Vozes, 2003.
  • MOSCOVICI, Serge. A invenção da sociedade: sociologia e psicologia. Tradução Maria Ferreira. Petrópolis, RJ: Vozes, 2011.
  • PARANÁ. Secretaria da Educação. Dia a dia da educação. Educação Física. 2020. Disponível em: http://www.educacaofisica.seed.pr.gov.br/modules/conteudo/conteudo.php?conteudo=392. Acesso em 23 set.2020.

Externamos nossos agradecimentos à professora doutora Romilda Teodora Ens, por sua entrevista e pela gentileza da cessão de sua foto.
[1] Para quem não conhece, o jogo de “bete ombro”, “betes” ou “taco”, típico do interior do Brasil, é praticado em campos abertos ou mesmo na rua, com dois tacos de tamanho médio, dois alvos e uma pequena bola de borracha, de meias ou de tênis. É jogado por duas duplas, sendo que uma detém os tacos e outra a bola. É preciso tomar cuidado com os tacos, para não atingir os jogadores, que têm por objetivo derrubar o alvo por meio do lançamento da bola (PARANÁ, 2020).
[2] Atual Instituto de Educação do Paraná Erasmo Pilotto.
 

Alexandra F. M. Ribeiro é doutoranda e mestre em Educação – Linha de Pesquisa História, Memória e Políticas Educacionais e Alboni. M. D. P. Vieira é doutora e mestre em Educação – Linha de Pesquisa História, Memória e Políticas Educacionais.