Ressaca Cultural: O Pintassilgo – Arte, sentimentos, vida e morte

As referências à arte e as mensagens que o livro traz são seus pontos fortes. A autora se utiliza muito de descrições extremamente minuciosas não apenas de objetos e lugares, mas também dos sentimentos e sensações, o que, por vezes, torna a leitura um pouco arrastada e cansativa

Mariana Ramiro
O Pintassilgo, da escritora norte-americana Donna Tartt, é um livro que me deixou extremamente dividida. Ao mesmo tempo em que, à medida em que fui me aprofundando na história, fui me envolvendo e me interessando cada vez mais, por outro lado, eu também fiquei cansada com a morosidade e prolixidade do texto em alguns momentos.
Theodore Decker é um garoto de 13 anos que tem sua vida tragicamente alterada quando o museu em que ele e sua mãe se encontram é alvo de um atentado terrorista. Após a explosão, Theo acorda desnorteado em meio aos destroços e à poeira, e sem saber ao certo o que estava acontecendo. Ele encontra nos escombros do museu um outro visitante, um senhor chamado Welty. Depois de poucas palavras trocadas, o senhor, já está prestes a morrer, pede que Theo, que se sente bem fisicamente, pegue uma pintura que está na mesma sala que eles: o Pintassilgo. O garoto acaba segurando-a para mostrá-la à Welty e depois, perdido, guardando-a em sua mochila.
A pintura existe de fato e foi obra do artista holandês Fabritius. O pintor, discípulo e contemporâneo de Rembrandt, morreu em 1654 após a explosão do armazém de pólvoras da cidade, que acabou atingindo seu ateliê. O Pintassilgo foi uma de suas poucas pinturas que sobreviveram ao incêndio.
Voltando ao livro, Theo descobre que sua mãe morreu na explosão – passagem brilhantemente construída, pois sentimos a angústia e desespero do protagonista até ele descobrir o que aconteceu – e se vê obrigado a mudar de casa, de cidade e de amigos. E o Pintassilgo o acompanha como uma presença constante permeando toda a obra.
Penso que Theo se agarrava à pintura por sua beleza e unicidade, mas também como se ela fosse o único elo possível entre ele e sua mãe, já morta, e Welty, com quem dividiu o momento mais trágico e traumatizante de sua vida. E por ser a única prova física de que aquele momento tormentoso em que esteve entre vivos e mortos, no meio de ruínas, obras de arte, corpos e poeira, de fato aconteceu.
Apesar da ligação que possui com a obra de arte e de um sentimento profundo de admiração e proteção que nutre por ela, Theo se vê diante de algumas situações complicadas, que vão ficando cada vez mais difíceis de escapar, causadas tanto pela desgraça que presenciou, quanto pelo crime que cometeu: roubar uma obra de arte. Assim, acompanhamos ao longo do livro o caminho desse personagem errante e extremamente traumatizado por tudo que viveu.
A ideia do enredo é instigante e as várias mensagens que a obra passa são super relevantes. No entanto, senti que a leitura se tornou cansativa e arrastada em alguns momentos. A autora se utiliza muito de descrições extremamente minuciosas não apenas de objetos e lugares, mas também de sentimentos e sensações.
O personagem principal, com quem consegui criar uma certa identificação e empatia no início do livro, foi se perdendo ao longo da história e foi cada vez mais difícil conseguir continuar torcendo por ele. Os personagens secundários, como a garota por quem Theo é apaixonado, seu mentor ou seu melhor amigo, acabaram sendo mais cativantes e interessantes a meu ver.
Apesar desses aspectos, o fato de a obra ser permeada por referências à arte e as mensagens que traz são, na minha opinião, seus pontos fortes. No livro são levantadas algumas discussões como se é possível ou não viver uma vida plena, qual é o propósito não só da nossa existência, mas também do que acontece conosco e tudo pelo que temos que passar, e a complexidade de cada ser.
O mentor de Theo, Hobie, faz um tocante discurso sobre a beleza subjetiva da arte e como cada um, ao longo dos séculos, é impactado de maneira diferente pela mesma obra. Não há uma só obra que possa ser vista e sentida exatamente da mesma maneira por pessoas distintas. Acredito que é o que aconteceu com esse livro. Vi muitos elogios e muitas resenhas positivas e, com certeza, reconheço seus méritos e inclusive a delicadeza da autora ao contar uma história que vai tão fundo na mente e nos anseios de um personagem. No entanto, para mim, foi cansativo ler essa história. Afinal, a escrita também é uma arte e, assim como todas as outras, depende da interpretação e da percepção de cada um. A arte é, de fato, subjetiva.
 

Mariana Ramiro é uma profissional de marketing apaixonada por livros desde que se conhece por gente. Ela também é dona do canal Ressaca Cultural, no YouTube, onde compartilha experiências literárias e cinematográficas e você pode acessar AQUI.

 

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