“Cartografia Sentimental Tucuju”: Filme de diretor curitibano estreia no Cine Passeio

Produção marca a estreia do professor, produtor e diretor teatral Cleber Braga em obras audiovisuais

Uma cultura múltipla e complexa em uma região com fortes influências indígena e negra, além da europeia. Esse é o retrato que faz o longa-metragem “Cartografia Sentimental Tucuju”, do diretor curitibano Cleber Braga, que estreia com exclusividade no Cine Passeio nesta quinta-feira, 11 de novembro, na Sala Vitória, destinada à programação on-line gratuita. O filme ficará em exibição por uma semana, até o dia 17. Para assistir, basta acessar www.cinepasseio.org.

O público de Curitiba poderá conhecer diferentes artistas da cultura tucuju por meio de uma “cartografia sentimental”, como o próprio título sugere, termo criado pela autora brasileira Suely Rolnik, que pode ser explicado como um mapeamento afetivo e serviu de inspiração para Braga na criação do filme. “Eu acredito que a maior riqueza ali, apesar da exuberância da natureza, é a humana. Isso me chamou a atenção desde o início, o macapaense se interessa pelo outro, pelo diferente e o acolhe carinhosamente”, observa. “Cada cena é consequência de uma história, de um encontro, de um afeto, de uma admiração. E eu acho lamentável que o Brasil desconheça histórias como essas”.

Tucuju é uma etnia indígena que habitou o Amapá, contudo hoje o nome também é utilizado para denominar quem nasce na região. “No caso do filme, o termo funciona quase como um sinônimo para macapaense”, explica o diretor.

Entre os artistas apresentados estão Oneide Bastos e Paulinho Bastos, respectivamente mãe e filho, membros de uma família composta por músicos. Outros artistas que participam do filme são Ana Caroline e Jones Barsou, da Casa Circo, primeiro grupo amapaense que participou do evento Palco Giratório do Sesc, viajando por todo país.

Mas também são mostrados outros modos de criações culturais, como na participação de Maria Trindade, uma ativista pelo direito das mulheres escalpeladas – que têm o couro cabeludo arrancado, geralmente quando crianças, pelos motores dos barcos. “Conheci Trindade porque buscava por uma costureira. Quando entrei em seu ateliê e a vi fazendo perucas, perguntei para quem seriam. Ela me contou que recolhia doações de cabelo e confeccionava perucas para doar para estas meninas, porque desejava que elas nunca deixassem de se amar, de amar a vida. Trindade traduz essa força do povo Tucuju, essa generosidade e alegria, como pode ser visto em seu relato no filme”, conta o artista.

Diferenças e semelhanças de uma multiplicidade chamada Brasil

“Cartografia Sentimental Tucuju” é a primeira obra audiovisual do professor, produtor e diretor teatral Cleber Braga, produzida depois de um hiato artístico para a realização de seu doutorado em Cultura e Sociedade pela Universidade Federal da Bahia. Voltado ao teatro, ele iniciou seu trabalho em Curitiba no início dos anos 2000, quando criou o coletivo artístico “O Elenco de Ouro”, que chegou a fazer apresentações pela Europa e América Latina. Em 2016, chegou a Macapá para ser professor da Universidade Federal do Amapá, onde se deparou com uma cultura brasileira que até então desconhecia.

“A experiência de viver no Norte do país, na Amazônia, teve um impacto decisivo na minha vida. Fez-me e faz-me questionar o modo como narramos o Brasil desde determinadas regiões, determinadas realidades, como se aquilo fosse o todo. Não é. Basta olhar o mapa para constatar a diferença de tamanho entre os estados do Sul e do Norte. A Amazônia é um mundo!”, define Cleber Braga.

Jones Barsou, um dos artistas participantes do filme. Foto: Ianca Moreira

O diretor lembra-se de como Curitiba foge do imaginário do Brasil festivo, caloroso, tropical, paradisíaco – o que também ajuda a mostrar como o Brasil vai além dos estereótipos. “O Paraná é muito mais do que o discurso nostálgico sobre a colonização europeia. Indígenas, negros, árabes, ciganos, japoneses, entre tantos outros povos, fazem este lugar, são o Paraná, ainda que as narrativas oficiais sigam fazendo seu apagamento”, considera.

Mesmo com tantas diferenças culturais, ele avalia que o Paraná e o Amapá são mais semelhantes do que podemos imaginar. “Eles são o Brasil, eles compõem o Brasil em toda sua multiplicidade. Isso só não é tão perceptível porque as marcas coloniais do racismo ainda impedem uma compreensão mais ampla sobre nós mesmos. E nós temos o dever de romper este ciclo”, afirma. “Por isso esse filme, essa cartografia sentimental, essa partilha e esse convite para entendermos mais o que somos como país, para além de estereótipos”, pontua o diretor.

Além de um documentário

Embora possa parecer um documentário, Cleber Braga afirma que não é possível definir “Cartografia Sentimental Tucuju” em nenhum gênero cinematográfico. “Assim como em um jogo, cada uma dessas pessoas foi convidada a propor uma ação de curta duração. O resultado é um conjunto de performances, cenas, números musicais, etc, sem uma linguagem artística definida”, explica Braga, ao aproximar a obra da ideia de cabaré. “Minha pesquisa e prática artística no teatro é marcada pela experiência do cabaré – um gênero espetacular que tem, como uma de suas características, a diminuição da fronteira entre arte e vida.”

O filme foi idealizado durante a pandemia e realizado em parceria com o coletivo audiovisual Tenebroso Crew. As gravações ocorreram no mês de julho de 2021, no espaço multicultural Céu das Artes de Macapá, seguindo todos os protocolos de segurança. A produção ainda conta com trilha sonora de Paulinho Bastos, produção executiva de Paulo Rocha e administração da OCA Produções. A obra foi realizada com fundos da Lei Aldir Blanc (SECULT/AP) e em parceria com o Programa de Cultura da Universidade Federal do Amapá (UNIFAP).

Mais informações sobre o filme estão disponíveis no Instagram, no Facebook e no site www.sites.google.com/view/cartografiasentimentaltucuju.

FICHA TÉCNICA DE “CARTOGRAFIA SENTIMENTAL: TUCUJU”

Equipe da produção do filme. Foto: Ianca Moreira
  • Concepção e direção artística: Cleber Braga
  • Captação e direção audiovisual: Tenebroso Crew
  • Trilha sonora original: Paulinho Bastos
  • Produção Executiva: Paulo Rocha
  • Administração: OCA Produções
  • Elenco:
    Cleber Braga
    Albert Cordeiro
    Cristiana Nogueira
    Lylian Rodrigues
    Piedade Videira
    Ana Caroline
    Jéssica Thaís
    Laura Silva (Laura do Marabaixo)
    Maniva Venenosa: Igor Vasconcelos Pantoja, Priscila Danielle França Costa de Araújo, Rodrigo Góes Pereira e Miqueas Alves Pinto
    Maria Trindade Gomes
    Jones Barsou
    Pretogonista
    Mc Deeh
    Luiz Henrique Oliveira (Luizinho D’OSUN)
    Jorge Alberto (Pai Poca Ty Ayra)
    Luiz Iago(Pai Iago Ty iroco)
    Rafael Saldanha (Rafa Ty Yemonja)
    Nau Vegar
    Carla Antunes
    Karina Mateus
    Loran da Silva Ferreira
    Oneide Bastos
    Paulo Bastos
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curitiba de gracahttps://curitibadegraca.com.br
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