Professora deixou um legado na educação paranaense e teve grande importância na consolidação e estruturação do Mestrado em Educação da UFPR
Alexandra F. M. Ribeiro e Alboni. M. D. P. Vieira
Zélia Milléo nasceu em 18 de junho de 1928, na cidade da Lapa. Era a segunda da prole de seis filhos do casal João Milléo e Gasparina Lima Milléo. No artigo “Mulher, mãe, professora: Zélia Milléo Pavão”, de autoria de Winkeler, Santos e Pryma (2016), é possível conhecer relatos da professora, de colegas e de orientandas.
Zélia acompanhava a mãe nas atividades profissionais como professora de classes iniciais da Lapa. Zélia narrou para Winkeler, Santos e Pryma (2016) que sua brincadeira preferida era ensinar. Contrariando a vontade da mãe, muitas vezes deixava de fazer suas atividades para auxiliar os demais colegas com dificuldades. A mãe não queria que ela ajudasse, pois não era professora, mas Zélia considerava que poderia explicar de outra maneira, na linguagem das crianças, para que os colegas pudessem compreender.
Como não havia curso de magistério em todos os municípios e intuindo dar sequência aos estudos para tornar-se professora, Zélia deixa a Lapa ao terminar o curso primário. Em Curitiba, foi interna no Colégio Sagrado Coração de Jesus, instituição com ensino exclusivamente feminino até a década de 1990. Para dar sequência a seus estudos com o Curso Normal, passa a residir no pensionato das irmãs da Emiliano Perneta. No Instituto de Educação do Paraná, Zélia recebe o incentivo e a influência do professor Erasmo Pilotto e de outros renomados professores. De acordo com Winkeler, Santos e Pryma (2016), os mestres do Instituto de Educação do Paraná a formaram “ensinando-a a palmilhar o universo do outro […], levando-a a assumir integralmente o papel de educadora”. No ano de 1950, licencia-se em Pedagogia e em 1961 gradua-se como Bacharel em Matemática, ambos os cursos feitos na Universidade Federal do Paraná́ (1961). Nessa trajetória, delineava-se a profissional Zélia, “verdadeira mestra intuitiva, que cedo revela suas qualidades de educadora: respeito ao outro, atenção às suas necessidades e dificuldades, desejo de colaborar, capacidade de transmitir, procurando o modo mais adequado de sanar as dúvidas” (WINKELER; SANTOS; PRYMA, 2016, p. 76).
O casamento com Jurandir Pavão e os quatro filhos não impediram Zélia de dar sequência a suas pesquisas e profissão. Na UFPR, defendeu tese em Educação no ano de 1956 e em Estatística no ano de 1963. Para ampliar seus conhecimentos e confrontar realidades, fez especializações na University of Southern California no ano de 1970 e na Université Paris-Sorbonne em 1976. Winkeler, Santos e Pryma (2016) explicam que Zélia era vista como exemplo de mulher independente e profissional dedicada às gerações mais jovens. Essas características colocavam-na à frente de seu tempo.
Como professora, Zélia procurava suprir carências, melhorar a autoestima e despertar o gosto pelos estudos nos estudantes. Ela se atinha às peculiaridades de cada aluno e procurava atendê-lo integralmente, premissa que levou para a docência universitária. Com cada aluno da UFPR que estava sob seus cuidados, Zélia assumia o “papel de compreender em exaustão o que ele pretende e procura a melhor forma de orientá-lo”, estando a porta de seu gabinete sempre aberta, como declaram Winkeler, Santos e Pryma (2016).
Na UFPR e na PUCPR, a professora Zélia formou grandes profissionais em educação, docentes e pesquisadores. Com respeito ao estudo e a busca incansável de conhecimento, dava suporte científico e emocional, mas exigia de seus orientandos alto rigor metodológico. Com longa experiência em pesquisa, Zélia publicou o artigo intitulado “Pesquisa prática: seus principais instrumentos”, no qual explicava alguns instrumentos para a coleta de dados e a adequação para cada tipo de pesquisa. Em suas palavras:
O importante é que o investigador saiba, com exatidão, que classe de dados pode proporcionar cada uma dessas técnicas, quais são suas vantagens e limitações, as premissas em que se fundamenta seu emprego e o grau de validade, objetividade e confiabilidade que possuem. (PAVÃO, 2002, p. 2).
Winkeler, Santos e Pryma (2016) salientam que Zélia ensinava seus orientandos a estudar, investigar e produzir conhecimento e “tudo devia ser excessivamente provado, documentado”, já que “a defesa era o momento supremo”. Professora Zélia vibrava nas apresentações das dissertações, pois era o momento da consagração.
Sua humildade, competência, calma, habilidade de ouvir e compreender a vida e a profissão daqueles que a rodeavam também foram destaques nas narrações de seus ex-orientandos. Uma de suas orientandas declarou para Winkeler, Santos e Pryma (2016) que Zélia era inteligentíssima, detinha incrível importância institucional e que a humildade tornava-a exemplo aos demais. Outra orientanda destacou o quanto Zélia acreditava na possibilidade de aprendizagem e mudanças, que depositava confiança e favorecia a construção do conhecimento. Em outro relato, afora a competência acadêmica, são destacadas as características de força, determinação e afetuosidade que favoreciam o desenvolvimento pessoal e profissional daqueles que orientava. Zélia considerava que tudo era motivo para pesquisa e respeitava o interesse do orientando e para aquele que dizia não saber o que pesquisar ela dizia que um dia, em uma sala de aula, ele encontraria pelo menos uns dez temas de estudo, narrou outra ex-orientanda. Zélia tornou-se modelo e inspiração para os que tiveram a oportunidade de com ela conviver.
Ela ocupou cargos de destaque no âmbito educacional paranaense. Foi diretora do Setor de Educação, sendo a primeira mulher a assumir o cargo de direção de setor na UFPR, entre os anos de 1972 e 1981 (UFPR, 2021). Além disso, coordenou cursos e esteve à frente da coordenação do Departamento de Estatística da UFPR. Apesar de ocupar cargos de destaque, não se deixou abater diante de disputas de poder desse campo. Com tranquilidade, falou para Winkeler, Santos e Pryma (2016) que fazia seu trabalho sem se importar com o que os demais falavam. Na UFPR, suas atividades eram intensas, mas com tranquilidade, dinamismo e proatividade Zélia as coordenava. Ao aposentar-se da UFPR, passou a ministrar aulas no Programa de Pós-graduação em Educação da PUCPR.
Zélia destacou-se como grande profissional que cooperou para a constituição da educação paranaense. No entendimento de Winkeler, Santos e Pryma (2016), “ao conhecer a história de vida da professora Zélia, torna-se difícil não se inspirar profissionalmente, querer seguir seus passos”, ademais, a trajetória de Zélia registra “na memória das pessoas que a vida de professor vale a pena ser vivida e construída, embasada na seriedade e na serenidade”.
Zélia faleceu no dia 7 de julho de 2021, aos 93 anos. Em nota publicada no site da UFPR, a Superintendência de Comunicação Social lamentou a morte daquela que atuou na instituição, no Setor de Educação como docente, pesquisadora, extensionista e gestora. Em homenagem, o Conselho Setorial do Setor de Educação da UFPR salientou o importante legado deixado pela docente ao campo da educação, em especial no cenário paranaense e curitibano, além de destacar a fundamental importância de Zélia na consolidação do setor e na proposição e estruturação do Mestrado em Educação da UFPR.
Para saber mais
- PAVÃO, Zélia Milléo. Pesquisa prática: seus principais instrumentos. Revista Diálogo Educacional, Curitiba/PR, v. 2, n. 4, p. 85-94, 2002. Disponível em: https://periodicos.pucpr.br/index.php/dialogoeducacional/article/view/3892. Acesso em: 1.o ago. 2021.
- UFPR. Universidade Federal do Paraná. UFPR lamenta a morte da professora aposentada Zélia Milléo Pavão. UFPR, Superintendência de Comunicação Social, 08 jul. 2021. Disponível em: https://www.ufpr.br/portalufpr/noticias/ufpr-lamenta-a-morte-da-professora-aposentada-zelia-milleo-pavao/. Acesso em: 1.o ago. 2021.
- WINKELER, Maria Sílvia Bacila; SANTOS, Denise Grein; PRYMA, Marielda Ferreira. Mulher, mãe, professora: Zélia Milléo Pavão e seu legado à educação paranaense. Revista Pedagógica, Chapecó, v. 18, n. 37, jan./abr. 2016. Disponível em: https://bell.unochapeco.edu.br/revistas/index.php/pedagogica/article/view/3168. Acesso em: 1.o ago. 2021.
Alexandra F. M. Ribeiro é doutoranda e mestre em Educação – Linha de Pesquisa História, Memória e Políticas Educacionais e Alboni. M. D. P. Vieira é doutora e mestre em Educação – Linha de Pesquisa História, Memória e Políticas Educacionais.
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